Como os homens vivem o luto
A maior parte dos estudos levados a cabo na área do luto perinatal, focam-se sobretudo na experiência materna, pelo que é recente o reconhecimento da dor vivida pelos homens que perdem os seus bebés. Sabemos, então, que o luto perinatal manifesta-se de forma distinta em mães e pais, refletindo diferentes modos de experienciar e expressar a perda.

Há experiências comuns a pais e mães que perderam os seus bebés:
- tristeza e saudade do bebé que partiu;
- medo e incerteza em relação ao futuro;
- culpa e isolamento;
- sintomas de luto como: insónias, pesadelos, falta de apetite e de energia, choro, pensamentos intrusivos;
- dificuldade de vínculo com nova gravidez e que pode prolongar-se após o nascimento do bebé;
- possibilidade de desenvolverem de stress pós-traumático, ansiedade e depressão
No entanto, há outras vividas particularmente vividas no masculino:
ter de ser forte para estar ao lado da companheira
Apoiar a companheira é a face mais visível do luto paterno. Apoiar emocionalmente e ajudar em aspetos práticos torna-se muitas vezes uma missão a tempo inteiro, já que há experiências únicas da mulher — como o parto ou a chegada do leite — que o homem apenas acompanha.
Embora o apoio possa ser bastante redentor, pode também levar muitos pais a esconder as próprias emoções para poupar a companheira. Frequentemente, sentem que não têm “direito” de colocar mais carga numa vivência já tão devastadora.
As diferenças na forma de viver o luto podem gerar conflitos, No entanto, para muitos casais, enfrentar a adversidade em conjunto faz com que o seu vínculo fortaleça muito e a própria relação evolua para um novo patamar de crescimento e intimidade.
corresponder a expectativas sociais
As expectativas sociais assentes num ideal de masculinidade de que “um homem não chora” e que tem de aguentar, moldam a experiência do luto. Havendo pouco espaço social para a manifestação de dor e saudade, é comum que este luto se manifeste de como:
- apatia emocional
- afastamento e silêncio
- uso de brincadeiras e humor para aliviar a tensão
- irritabilidade e falta de concentração (sobretudo no trabalho ou na condução)
- evitamento da casa ou de atividades familiares
lidar com comentários insensíveis
O luto paterno é pouco visto socialmente. E, muitas vezes, quando é notado, as palavras de consolo passam por:
- “Não penses mais nisso.”
- “Para a frente é que é caminho”
- “O tempo cura tudo”
- “São coisas que acontecem”
- “A tua mulher deve estar mesmo mal, agora tens de a ajudar”
ser invisível em contexto hospitalar
Também no contexto hospitalar onde se espera cuidado e atenção, a realidade frequentemente fica aquém das expectativas. Há poucos profissionais formados em luto e, além disso, os cuidados recaem quase exclusivamente sobre a mulher, cingindo o homem a um papel de acompanhante que pode resultar em sentimentos de exclusão e inutilidade.
regressar imediatamente ao trabalho
Os locais de trabalho também podem ser uma fonte de stress, pois o tempo de licença para os pais é curto ou inexistente e a expectativa é que a produtividade retome o nível de performance anterior à morte do bebé. Muitas vezes, é no local de trabalho que alguns sintomas de luto se manifestam de forma mais clara e expressiva: maior irritabilidade, menor tolerância a erros ou aos outros, dificuldades de concentração, sensação de burnout.
Se familiares, amigos, colegas de trabalho, assistentes sociais, profissionais de saúde não acolhem o pai e tampouco lhe perguntem “Como é que isto está a ser para ti?”, onde é que ele encontra o tempo e o espaço para falar sobre a sua perda?

Passos essenciais para lidar com a perda
Comunicação
O apoio a pais que perderam o seu bebé deve começar logo no hospital, com os profissionais envolvidos. A empatia e clareza na comunicação são fundamentais, mas adicionalmente, é imperativo reconhecer que o luto paterno tem nuances específicas (como as referidas acima) que precisam ser acomodadas.
Apoio psicológico
Sabemos que o apoio psicológico é protetor para a sua saúde mental e bem-estar geral, não só no momento da perda, mas também nos meses que se seguem e no possível planeamento de uma futura gravidez.
Grupos de pais em luto
A inserção em grupos/rodas de pais em luto para partilha de experiências é também um recurso de muito valor e cada vez mais procurado pelos pais. Escutar outras experiências e partilhar a própria, pode ter um papel modelador nesta travessia.
No fundo, falamos aqui de reconhecimento da dor como um cuidado essencial. Existem técnicas para apoiar a perda, mas a verdade é que as atitudes mais simples como a gentileza e serenidade nas interações, são a base fundamental para estar presente num momento de dor.
Se esta partilha te tocou pessoalmente por teres perdido um filho, lamentamos mesmo muito a tua perda. Se sentires que precisas de falar sobre o que aconteceu, estamos aqui para te receber.
Se conheces alguém que passou por uma perda, sabe que a tua presença é mesmo muito importante. Se não sabes o que dizer a quem perdeu um bebé, podes apenas escutar, conversar, entregar contactos de profissionais habilitados a trabalhar com luto perinatal e tudo isto, acredita, já é muito mais do que possas imaginar.
NOTAS:
Parents experiences of pregnancy following perinatal loss: An integrative review